Temos um mundo de informações a um clique de distância de nós. Mas o que parece ser a solução de todos os nossos problemas, na verdade, é a porta de entrada para o surgimento de muitos outros.

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Enquanto eu reunia as informações para escrever esta reportagem, divida a minha concentração entre duas telas: a do computador e a do meu celular, sobre a mesa. A cada clique na tela do telefone para ver se havia alguma notificação, sentia que a dependência do aparelho é algo assustador.

Eu já tive a minha experiência de detox digital. Por um período desativei meu Facebook e WhatsApp e ei as férias de final de ano alheia ao mundo digital, reconectando-me com a natureza no sitio dos meus pais. Foi libertador sentir a paz de não precisar checar o celular a cada cinco minutos. Também neste ano fiz uma breve experiência de ficar sem Instagram e, apesar do pouco tempo de distanciamento, consegui comportar-me muito bem longe da rede, isso porque eu coloquei na minha mente que eu não precisava daquilo.

Mas meu trabalho como jornalista envolve estar conectada, seja para ficar por dentro das informações ou ainda manter contato com as pessoas e divulgar as minhas produções, por isso eu voltei a usar.

E então, por muitas vezes, vejo-me como refém da tecnologia. Esse sentimento de prisão, aliado à ansiedade e dependência é uma característica marcante na maioria das pessoas que vivem on-line.

Uma pesquisa da Associação de Psiquiatras Americana revelou que mais de um terço dos adultos nos Estados Unidos consideram as redes sociais prejudiciais à saúde mental. Somente 5% consideraram as redes positivas para a saúde mental, outros 45% disseram acreditar que há efeitos positivos e negativos. Dois terços dos participantes da pesquisa afirmaram acreditar que o uso das redes sociais tem relação com isolamento e solidão. Há estudos que relacionam as redes à depressão, inveja, baixa autoestima e ansiedade social.

De acordo com um estudo feito pelo Instituto Delete, que tem a missão de orientar a população sobre o uso consciente das tecnologias, de cada cem pessoas atendidas, 80 fazem uso abusivo de tecnologia. Dessas, 20 sofrem de algum transtorno, como depressão, fobia social ou síndrome do pânico.

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Além de realizar pesquisas, o instituto busca ajudar as pessoas por meio de uma avaliação em que na primeira consulta o paciente é classificado em uma de três categorias: consciente, que usa a tecnologia de forma racional; abusivo, que usa de forma exagerada; ou dependente, que perdeu o controle sobre os dispositivos eletrônicos. Em tese, os abusivos são tratados com psicoterapia; e os dependentes, com medicamentos.

Parece assustador imaginar que o que era para facilitar a nossa vida de repente se tornou um dos maiores vilões para a nossa saúde mental.

A empresária de 32 anos Fernanda Pompeo de Camargo é uma das inúmeras pessoas em todo o mundo que sentiram na pele a dependência do dispositivo. Ela conta que, apesar de não ser totalmente viciada nas redes sociais, o uso excessivo do celular ou a atrapalhar seu bem-estar.

“Eu não era uma pessoa superativa, porque nunca fui carente de likes, mas tinha a necessidade de olhar a rotina de empresas e influencers que, de certa forma, fossem agregar conteúdo para a minha vida e meu trabalho”.

Explica Fernanda.

Mas em meio ao conteúdo pertinente, as redes sociais também tinham postagens relacionadas a assuntos que Fernanda não gosta de acompanhar, como discussão política. E ao lidar com um feed cheio de discussões e publicações voltadas a esse assunto, ela sentiu-se incomodada e percebeu como o contato com aquele conteúdo estava deixando-a irritada. Foi quando decidiu afastar-se.

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“Eu não saí do Facebook nem do Instagram, eu desativei os aplicativos do meu celular para não olhar mais e, desde então, eu não entro mais em nenhuma das redes.”

De acordo com outra pesquisa, desta vez da Deloitte, realizada nos Estados Unidos, o tempo de checagem do celular vem aumentando tanto em jovens como em adultos, que se utilizam dos aparelhos para olhar redes sociais e ar sites de notícias. A média é de 52 vezes por dia – um aumento de cerca de 6% em relação ao ano ado.

Além disso, 39% dos consumidores americanos acham que usam muito o smartphone, e 60% das pessoas de 18 a 34 anos item uso excessivo desse equipamento, chegando ao nível mais alto de qualquer faixa etária.

A pesquisa também revelou que o dos consumidores norte-americanos relatam que estão tentando limitar o uso de smartphones, mas apenas 32% estão conseguido reduzir.

E não para por aí, pois vários estudos atuais comprovam como as redes sociais são mais viciantes que drogas como álcool e cigarro. De acordo com uma pesquisa da instituição de saúde pública do Reino Unido, Royal Society for Public Health, em parceria com o Movimento de Saúde Jovem, o Instagram foi avaliado como a mais prejudicial à mente dos jovens. Isso porque o maior consumo da rede está entre os jovens de 14 a 24 anos.

Segundo o estudo, 90% das pessoas naquela faixa etária usam redes sociais, o que as torna ainda mais vulneráveis a seus efeitos colaterais. Ao mesmo tempo, as taxas de ansiedade e depressão nessa parcela da população aumentaram 70% nos últimos 25 anos. A pesquisa revelou ainda o perfil desses jovens, que estão cada vez mais ansiosos, deprimidos, com a autoestima baixa e sem sono.

Os 1.479 individuos entre 14 e 24 anos entrevistados classificaram as quatro principais redes sociais – YouTube, Instagram, Twitter e Snapchat – pelo grau de influência no sentimento de comunidade, bem-estar, ansiedade e solidão. E o resultado foi assustador para o Instagram, que foi considerado por eles o mais impactante negativamente, no qual o compartilhamento de fotos impacta no sono e na autoimagem e aumenta o medo dos jovens de ficar por fora dos acontecimentos e tendências, o chamado FOMO (fear of missing out).

E é ainda pior entre as meninas, entre as quais nove em cada dez se sentem infelizes com seu corpo e pensam em mudar a própria aparência, cogitando, inclusive, procedimentos cirúrgicos. Para esses jovens, a rede menos nociva é o YouTube, seguido do Twitter. Já o Facebook e o Snapchat ficaram na terceira e quarta posição, respectivamente.

A atitude tomada por Fernanda de se distanciar foi algo que devolveu a ela a paz de espirito e a consciência do quão mal o uso errado dos aplicativos faz para a saúde.

“Depois que eu desinstalei os aplicativos e consequentemente ei a usar menos o celular, eu comecei a reparar mais na minha casa e mantê-la organizada. Também senti diminuir a dor nas costas e pescoço e ainda aquela dorzinha chata que eu tinha na mão e até então não sabia do que era. Hoje vivo mais os meus momentos, me conecto olho a olho com os meus amigos e não deixo as notícias ruins me afetarem. Também ei a dedicar um tempo maior à leitura por meio dos livros impressos, algo que eu não vinha fazendo com o uso do celular”.

Comenta.

Apesar de somente usar o WhatsApp, pois este é fundamental para seu trabalho, Fernanda confessa querer um dia voltar a ar as redes sociais, no entanto hoje ela consegue identificar os perigos do uso excessivo e a importância de se desconectar.

“Uma hora eu vou querer usar o Insta de novo mas quando eu ver que estou caindo na rotina do automático eu vou parar.”

Jorge Dorneles, de 59 anos, também sentiu os efeitos do uso exagerado das redes sociais. Ele, que ou boa parte da vida sem o contato com a tecnologia, percebeu a diferença quando se deu conta de que o Facebook estava tomando muito tempo do seu dia e a dependência em postar e responder aos comentários de suas publicações diárias lhe causava estresse.

“Eu tinha uma média de 30 posts por dia, o que era algo extremamente exagerado. Depois de 11 anos utilizando a rede social, há pouco tempo decidi me afastar e não penso em voltar tão cedo”.

Explica.

Além disso, ele menciona a diferença entre a geração que viveu antes da tecnologia e a que já nasceu no mundo conectado.

“Eu vejo o pessoal de mais idade coma bagagem que eles trazem da literatura, então quando eles vão expor uma opinião no Facebook eles têm conteúdo e argumento, o que não existe muito na linguagem dos mais jovens, que acaba sendo mais superficial e sem opinião formada.”

Notícias ruins

Uma pesquisa da Associação Americana de Psicologia identificou que a maioria dos americanos vê o consumo de notícias por um lado negativo, destacando que elas causam estresse, além de ansiedade, fadiga ou perda de sono. No entanto, um em cada dez adultos verifica as notícias a cada hora, e 20% dos americanos ficam constantemente monitorando seus feeds de mídia social, o que acaba os expondo às últimas notícias.

Consequências do uso abusivo das redes sociais

Ao ler até aqui, você provavelmente se identificou com os sintomas. E ainda tem mais, além de causar essa dependência, distúrbios e frustrações, o uso excessivo do celular atrapalha o sono, causando insônia e ansiedade.

Um estudo chamado “Dormindo com o inimigo: como restringir o ‘uso do quarto de smartphones afeta a felicidade e o bem-estar”, de autoria de Nicola Hughes e Jolanta Burke, recrutou 95 participantes para um teste com o celular, no qual 49 deles foram obrigados a não usar o telefone no quarto por uma semana, e os outros 46 foram instruídos a continuar usando o equipamento normalmente.

A pesquisa então revelou que os participantes que restringiram o uso de smartphones apresentaram pequenas melhorias na felicidade e qualidade de vida após uma semana, reduzindo o vício no aparelho. Eles também considerariam continuar fazendo isso. O estudo comprovou ainda alguns benefícios para a saúde, como:

  • aumento da felicidade e da qualidade de vida;
  • o risco de dependência de smartphones diminui quando os aparelhos são deixados fora do quarto;
  • ir para a cama sem smartphones no quarto melhora a qualidade do sono;
  • dormir sem celular melhora o sono, os relacionamentos, o foco e o bem-estar;
  • 93,6% dos participantes “poderiam” ou “considerariam” não dormir com o telefone novamente.

Priorize sua saúde

Constantemente batemos nesta tecla de que a sua saúde deve vir em primeiro lugar, mas automaticamente adquirimos hábitos que nos distanciam desse cuidado. Com a chegada da tecnologia, principalmente dos smartphones, as publicações impressas aram a ficar em segundo plano na vida das pessoas, servindo apenas para acumular poeira e enfeitar as estantes.

Mas, de acordo com um texto de Sam Upton publicado no site da Two Sides, evidências científicas mostram como substituir o telefone celular por uma publicação impressa pode ajudá-lo a viver mais. “As evidências a seguir farão você repensar quanto tempo gasta olhando para telas…”

Exame de saúde

De acordo com pesquisas recentes, o adulto médio a quatro horas por dia olhando para o smartphone, mantendo-o ao alcance do braço quase todo o tempo (Revista Momento, 2018).

Essa quantidade de tempo gasto com um dispositivo interfere com uma gama alarmante de elementos de vida e habilidades cognitivas, desde o tempo de sono e a qualidade das relações até a memória de curto e longo prazo, atenção, criatividade, produtividade e solução de problemas e decisões.

Mas, embora estes sejam problemáticos por si só, o que deve estar preocupando o usuário médio do telefone é o fato de que o uso do dispositivo aumenta os níveis de cortisol, o principal hormônio do estresse do corpo.

O cortisol é o hormônio que controla a reação de luta ou fuga, desencadeando mudanças psicológicas que ajudam o corpo humano a reagir e sobreviver a ameaças perigosas. “Níveis elevados de cortisol têm sido associados a um aumento do risco de problemas graves de saúde, como depressão, obesidade, diabetes tipo 2, problemas de fertilidade, pressão alta, ataque cardíaco, demência e derrame.”

Infelizmente para o fã do telefone, essas mudanças incluem aumentos rápidos na pressão arterial, frequência cardíaca e açúcar no sangue – nenhum deles é bom para o corpo, especialmente quando eles podem acontecer toda vez que seu telefone o deixa irritado ou frustrado, feliz ou excitado – gatilhos emocionais exatos que tornam o seu telefone tão atraente.

“Seus níveis de cortisol são elevados quando o telefone está à vista ou nas proximidades, ou quando você ouve ou até acha que ouve. É uma reação ao estresse e parece desagradável, e a resposta natural do corpo é querer verificar o telefone para fazer com que o estresse desapareça.”

diz David Greenfield, professor de psiquiatria clínica da Universidade de Connecticut School of Medicine.

O flipside

Assim como há muitos perigos físicos e psicológicos do uso excessivo de smartphones, há tantos benefícios para a leitura de impressos. Seja um jornal, uma revista, um catálogo ou um livro, comprovou-se que a impressão melhora a saúde de seus leitores, diminuindo a frequência cardíaca e a pressão sanguínea, ao mesmo tempo em que proporciona uma compreensão mais profunda e satisfatória de um assunto ou história.

Estudos neurológicos mostraram que a atividade cerebral ao ler a impressão é significativamente diferente da leitura em uma tela. Ao ler conteúdo digital, o cérebro percorre a cópia captando apenas palavras-chave ou texto destacado ou em negrito.

Mas a leitura impressa estimula a memória visual, melhorando a compreensão, a retenção e a recuperação de informações.

Dormir bem

Talvez o mais importante em um mundo cada vez mais perturbador e direcionado à mensagem, a leitura da impressão ajuda você a ter um sono mais longo e de melhor qualidade.

Uma vez que a privação do sono tem sido associada a doenças cardíacas, pressão alta, derrame e diabetes, ter um padrão de sono consistente tornou-se cada vez mais importante.

Em um estudo inovador, a Harvard Medical School pediu a 12 alunos que assem duas semanas lendo um e-book antes de irem para a cama, e depois duas semanas lendo um livro impresso.

O resultado mostrou que a leitura de um e-book diminuiu o sono e aumentou o cansaço no dia seguinte. Então, hoje à noite, quando você for pegar a tela para mais um e-mail ou post de mídia social antes de dormir, pegue um livro em seu lugar. Pode salvar sua vida.

Matéria publicada originalmente na edição de outubro de 2019 da Revista 100fronteiras. 

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