Você já parou para pensar o que acontece quando você quer falar uma palavra na sua língua e ninguém te entende? Pois bem. Vivi isso quando cheguei no Brasil e essa história é a de muitos de nós, talvez também seja a de você.
No mês de abril, vivi uma situação em sala de aula e tento, aqui, contar para vocês e tentar refletir juntos sobre isso. Uma aluna que não fala português, embora entende bem, também não fala espanhol e entende pouco, cursa minhas aulas de espanhol.
No primeiro dia vi ela tímida, retraída, mas com muita vontade de aprender, sorriso no rosto cada vez que aprendia uma nova palavra, porém, no fundo eu sentia que ela estava sozinha, com medos, nenhum aluno na sua volta. Pensei: vou colocar uma atividade em grupo para enturmar todo mundo! Foi o que fiz.
Observei se ela iria com os grupos, mas ficou quietinha no seu canto, também nenhum grupo chamou ela. Decidi, então, chamar um grupo e pedi que incluíssem a colega para a atividade. Foi o que aconteceu, mas foi sem sucesso também, pois mesmo no grupo eu observei que ela não estava entendendo. A língua. A língua que todos falam menos você.
Ela te aprisiona muitas vezes, faz um nó na garganta e não nos deixa falar. Na semana seguinte de aulas, chamei ela para conversar, perguntei como estavam as aulas e me ofereci a ajudar, ela olhou para mim e chorou. Chorou copiosamente e me falava baixinho: profe, não estou entendendo a tua língua, gosto muito do conteúdo, mas não estou entendendo a tua língua. Eu chorei também. Eu me vi. Eu também choro quando escrevo isto.
Pedi para ela algum livro na língua dela, me mostrou um que estava lendo naquele momento. Eu também não entendi, então, peguei a mão dela fui perguntando cada palavra. Depois de secarmos as lágrimas, começou a aula, cada palavra que a turma aprendia em espanhol, eu pedia para ela falar na língua dela.
Ahh, esse sorriso de volta no olhar dela. Sim, a língua tem esse poder de nos aproximar e nos afastar, de nos levar para outros lugares, também de nos aprisionar.
Às vezes, pode ser que você, o senhor e a senhora leitora, não perceba, mas quando você se aproxima falando a mesma língua, falando a outra língua, nosso mundo muda, nossa relação também.
Esta história pode ser real ou imaginária, pode ter acontecido comigo ou com você, mas o certo mesmo é que esta história acontece em muitas salas de aulas. Este relato é para sensibilizar ao senhor e a senhora leitora, pois se acontecer não deixe de mediar, de acolher ou de integrar, é nesse momento que nosso olhar pode mudar e tudo poderá se transformar.