Quando as portas foram abaixadas naquela semana atípica, na metade de março deste ano, assistimos em silêncio o barulho ensurdecedor do vazio. Vazio esse que se formou sem a presença dos turistas, clientes, empresários.
O ato de fechar o comércio não essencial de Foz do Iguaçu surgiu como uma medida extrema de prevenção. Sim, naquele tempo a situação do coronavírus na cidade ainda não era preocupante, mas por precaução, as medidas de contingência foram tomadas como forma de conter a disseminação do vírus na cidade.
Após mais de um mês fechado o comércio pôde voltar a abrir em 22 de abril, seguindo uma série de recomendações sanitárias e de segurança. Nessa época, o município contava com pouco mais de 38 casos de coronavírus, incluindo os que já estavam curados.
Até os atrativos turísticos voltaram a abrir em 10 de junho, aniversário da cidade, e com isso surgiu um momento totalmente novo e cheio de esperança. Mas a alegria durou pouco. No mês de junho os números aumentaram consideravelmente não apenas em Foz como em todo o Paraná. O sistema de saúde lotou e as mortes aumentaram, assim como a média diária de novos casos. Era o pesadelo voltando.
Nesse mês em que o comércio não essencial esteve fechado, muitos empresários não aguentaram pagar as contas e fecharam suas portas para sempre. Os que conseguiram se manter e reabriram na esperança de um novo recomeço, acordaram no dia 1º de julho sabendo que seus estabelecimentos devem permanecer fechados por mais 14 dias e dependendo da situação, aumentar mais sete e assim vai.

A incerteza quanto aos próximos dias, quiçá quanto ao futuro, amedronta, preocupa, faz perder o sono. E junto a esses sentimentos surge também a indignação. É, talvez essa seja a palavra que defina os comerciantes e empresários neste momento. Indignação. Porque é isso o que mais vemos nas redes sociais e grupos de whatsapp desde que o novo decreto do Governo do Paraná decretou novamente o fechamento do comércio não essencial em 134 cidades do estado.
A indignação das pessoas está em vários fatores. Um deles é sobre o que é ou não um serviço essencial, sendo que tudo o que gera renda é essencial. Além do mais, é quase que unânime o sentimento de revolta quanto ao novo decreto, porque é sabido que as festas clandestinas e reuniões em família continuarão existindo. As caminhadas ao ar livre sem o uso de máscaras e as filas extensas no mercado também e diante disso, os trabalhadores se veem lesados porque assistem quietos a ruína dos seus sonhos.
“Mesmo sendo otimista, e o otimismo é um escudo poderoso, não vejo a linha do horizonte. Todos os dias é uma batalha emocional, psicológica, física, e vejo, com tristeza o meu sonho e de muitos outros se apagando. Com este último decreto, muitos pequenos correm contra o tempo para não fechar suas portas, dispensar os funcionários, pagar suas contas, e eu sou uma, entre tantos que conheço. Só podemos contar com a solidariedade dos clientes, pois o auxílio do governo é limitado aos pequenos”, relata a empresária da Cantina da Bea, Beatriz Panni.
Para ela, fechar novamente o comércio não é a melhor solução. Mas ressalta que se for pra ser assim, então que seja para todos.
“Desde o início da pandemia deveria ter sido assim, mas o que vimos foi os grandes desafiando os decretos e o que virá, no final das contas, será uma curva de desempregados bem acentuada e muitos comércios fechando as portas”. No entanto, mesmo sem saber como serão os próximos dias, ela segue firme acreditando que logo tudo isso vai acabar. “Quem ar por este momento, mesmo com sacrifícios, acredito que terá uma possibilidade de seguir em frente”.

Empresários do setor turístico da cidade, que levaram meses estudando a reabertura segura dos atrativos, também receberam com indignação o novo decreto.
“Isso é um absurdo, falta o Governo Municipal tomar uma atitude séria, está prejudicando toda a economia e população, enfim, toda a cadeia em geral está sofrendo. É fácil colocar um decreto e simplesmente fechar as empresas, mas e a fiscalização? E todo mundo por aí sem mascara? As empresas e os atrativos turísticos estão tomando todos os cuidados necessários e obrigatórios por lei. É aqui que a pessoa vai pegar a Covid ou nos bairros, nas festas? Infelizmente o governo está cada vez mais adotando uma postura da facilidade, onde há decreto, notificação, multa e por aí vai, mas e nas ruas, fiscalizar a população, mandar a polícia fazer cobrança direta com as pessoas? Não fazem. É assim, infelizmente é fácil governar assim, e dane-se as empresas, dane-se a sociedade”, desabafa o proprietário do Hotel Tarobá, Mauro Sebastiany.
Ainda segundo ele, mesmo com o comércio fechado os casos vão continuar aparecendo, pois o que falta é uma fiscalização mais efetiva na cidade. “Isso mostra a incompetência do governo municipal e estadual. Eles têm que resolver o problema, não é só fazer decreto. É preciso tomar uma atitude com a Guarda Municipal e ter uma ação mais efetiva”, conclui.
Cenário da pandemia em Foz
Essa medida de fechar o comércio não essencial foi tomada como forma de conter o avanço expressivo da doença. Além dessa ação, o Grupo de Pesquisa em Vigilância Ativa da Fundação Municipal de Saúde está desde abril realizando inquérito sorológico na população de Foz para saber o grau de contato com o coronavírus
O primeiro inquérito sorológico foi realizado nos dias 29 e 30 de abril, com 754 exames e um resultado reagente. Nessa etapa foram usados testes rápidos, que têm sensibilidade de 35%. Já nos dias 14 e 15 de maio foram 943 exames sorológicos do sangue, que apresentam sensibilidade de 99%. O resultado foi 35 reagentes (positivo) e 908 não reagentes (negativo).
O último teste com 582 exames de sangue, feito nos dias 8 e 9 de junho, mostrou que 28% da população de Foz do Iguaçu pode ter tido contato com a Covid-19, segundo informações do Diretor Técnico do Hospital Municipal, Dr. Fábio Marques. Isso significa que quase 70 mil moradores tiveram contato com o vírus. Desse total de exames, 162 foram reagentes e 420 avaliados como não reagentes.

Isso faz parte da estratégia adotada pelo município para identificar o cenário e combater o coronavírus na cidade. Segundo o Dr. Fábio, Foz do Iguaçu é uma das poucas cidades do Brasil que faz inquérito epidemiológico, e a única que não utiliza teste rápido para fazê-lo.
Ele também explica que os resultados cresceram de 4,7% em maio para 28% em junho, o que significa que a cidade pode estar entrando em uma fase exponencial da pandemia.
“Iremos realizar entre hoje e amanhã de 800 a mil testes em diversas regiões do município para saber se esse número vai aumentar. Queremos ter os resultados até a próxima segunda, pois isso se fundamenta na teoria que quando uma pandemia atinge 55% a 60% da população ela começa a entrar numa fase de redução expressiva da transmissibilidade por causa da imunidade de rebanho. Com o resultado desse teste podemos ter segurança em relação as medidas restritivas ou suspensão delas para a reabertura da cidade com a volta do funcionamento normal”, destaca o médico.